domingo, 22 de setembro de 2013

Como empresas podem ajudar a aliviar o trânsito

Empresas ajudam no trânsito

Ações promovidas por empresas e funcionários podem ter um impacto significativo sobre o trânsito de cidades como São Paulo, argumenta um estudo do Banco Mundial que será apresentado nesta quinta-feira na capital paulista


  O estudo acompanhou por um ano um grupo de empresas na região da avenida Luis Carlos Berrini (polo empresarial na zona sul de São Paulo) e propôs um plano de mobilidade que abrangeu 1,5 mil funcionários — incentivando o uso de transportes público e alternativo e flexibilizando turnos de trabalho.


"O impacto quantitativo ainda não foi tão grande. Mas houve um impacto qualitativo em vários funcionários", diz à BBC Brasil Andrea Leal, consultora do Banco Mundial e coordenadora do estudo.


Se mais empresas aderirem a iniciativas do tipo, "haverá um efeito maior no trânsito da região", avalia Leal.


"Já vimos algo semelhante nos Estados Unidos, em Estados como Washington e Califórnia, onde há dados mostrando redução de congestionamentos e de viagens de carro por causa de programas de mobilidade corporativos", diz.


"Algumas cidades têm leis obrigando empresas com mais de cem funcionários a ter um plano de mobilidade e meta de reduzir o número de funcionários dirigindo sozinhos."


Medidas


O estudo de Leal listou algumas iniciativas que podem ser adotadas por empresas e pelo poder público para impactar o trânsito sem a necessidade de grandes obras viárias.


Mesmo com as deficiências de redes de transporte como a paulistana, que tem pontos de saturação e notadamente precisa de mais investimentos, Leal diz acreditar que é possível aproveitar melhor os recursos públicos já disponíveis e evitar viagens de carros.


A seguir, as sugestões aplicadas no projeto do Banco Mundial na Berrini:


1. Estimular o uso do transporte público entre os funcionários, por exemplo oferecendo linhas de ônibus fretados e eliminando a cobrança de 6% sobre o salário para custear o vale-transporte.


"Muitas empresas custeiam estacionamento para funcionários, mas cobram os 6% do vale-transporte", opina Leal. "É um desestímulo que parte do pressuposto de que que todos preferem ir de carro."


A pesquisadora diz que o poder público pode ter papel fundamental nesse ponto, dando incentivos fiscais para empresas que renunciarem da cobrança.


Funcionária do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, uma das participantes do estudo, a assistente de operações Natalia Sorrentino Silva, 26, trocou o carro pelo ônibus quando sua empresa abriu mão da cobrança do vale-transporte.


"O tempo de viagem de carro ou de ônibus é praticamente o mesmo, mas não aguentava mais o trânsito", diz Natalia — lembrando que, na hora do rush, carros levam até 30 minutos para conseguir sair da garagem, de tão congestionada que fica a Berrini. "Nos dias que venho de carro, volto mais tarde, em horários que não sejam de pico."


2. Ajudar os funcionários a conhecer suas opções de transporte. Segundo Leal, o hotel Hilton, outro participante do estudo, conseguiu incentivar o uso de transporte público produzindo um documento, entregue aos funcionários novos, detalhando todas as opções de linhas de trens, ônibus e metrô próximas.


3. Flexibilizar horários de trabalho, permitindo que funcionários façam sua jornada de forma a evitar deslocamentos em horários de rush e possam usar o transporte público em períodos menos congestionados.


4. Incentivar o trabalho à distância - algo que não se aplica a todas as empresas e funcionários, mas que pode aumentar satisfação e produtividade, argumenta Leal.


O Banco Mundial custeou parte dos custos de um projeto-piloto entre as empresas participantes, ajudando-as a implementar a tecnologia necessária e a definir metas para avaliar o trabalho feito por funcionários remotamente.


O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa é um dos que estão implementando o trabalho à distância, que até o ano que vem deve ser viabilizado para metade dos 43 empregados de sua sede em São Paulo.


"O funcionário ainda precisa participar de reuniões e eventualmente vir ao escritório, mas sem a carga de estresse de diariamente levar horas para ir e voltar do trabalho", diz Emilio Martos, superintendente de operações da empresa.


5. Estimular caronas, registrando-se em softwares e sites como www.caronetas.com.br ou montando páginas no Facebook nas quais funcionários possam organizar caronas entre si.


6. Melhorar a infraestrutura para quem quiser ir de bicicleta ao trabalho, como vestiários e bicicletários. "É algo controverso, porque muitos não acham seguro pedalar na cidade", diz Leal. "Mas em todas as empresas do estudo, ao menos 40% dos funcionários demonstraram interesse em pedalar ao trabalho.


" No projeto, o jeito foi reduzir os riscos organizando palestras com o grupo Bike Anjos, que disponibiliza ciclistas experientes para acompanhar novatos em seu trajeto casa-trabalho, buscar rotas mais seguras e ensinar cuidados de segurança.


7. Política de semana comprimida de trabalho: algumas empresas permitiram aos funcionários trabalhar uma ou duas horas a mais por dia e folgar um dia por semana ou a cada 15 dias.


8. Pensar em alternativas à lei de polos geradores de tráfego, que prevê que grandes empreendimentos que geram muito trânsito ao seu redor devem oferecer alguma contrapartida para mitigar seu impacto.


"Até hoje, essas contrapartidas são geralmente investimentos em obras viárias (novas pontes, acessos etc)", diz Leal.


"Mas isso incentiva o uso de carros. Esse dinheiro poderia ser usado para custear um corredor de ônibus ou ciclovia e outras formas de transporte alternativo. É preciso parar de partir do pressuposto de que as pessoas terão de chegar de carro ao local."


Resistência


O estudo deve fomentar o já aquecido debate sobre o transporte público em São Paulo e no Brasil, sobretudo após a onda de protestos de junho e julho – cujo estopim foi o preço da passagem. Pesquisa recente do Ibope indica aprovação de 93% às faixas exclusivas de ônibus ampliadas pela Prefeitura de São Paulo.


Apesar disso, Leal enfrentou resistências em muitas empresas para criar um plano de mobilidade. O estudo do Banco Mundial, que começou com 80 firmas da Berrini, acabou com apenas dez implementando medidas reais.


"Muitas empresas não consideraram isso uma prioridade, ou suas chefias não se envolveram diretamente no projeto", diz ela.


A segunda fase do projeto terá empresas que já têm manifestado interesse em implementar planos de mobilidade — algo que, segundo Leal, deve gerar efeito mais prático no trânsito paulistano.


"Defendemos (a necessidade) inquestionável de mais trens e metrôs, mas são soluções de longo prazo", argumenta Leal. "É importante que as empresas percebam que, se abrigam muitos funcionários, obviamente terão um impacto no trânsito da região. Elas também têm de ser chamadas a pensar em como mitigar esse impacto."


A coordenadora do estudo diz que as conclusões do projeto serão apresentado ao prefeito Fernando Haddad.

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